Nos Estados Unidos, a Comissão de Valores Mobiliários (SEC) lança o ambicioso “Project Crypto”, uma estratégia de regulatória que pretende transformar o país na capital mundial das criptomoedas. Idealizado sob a liderança do novo presidente da SEC, Paul Atkins, o projeto deriva do amplo relatório de 160 páginas produzido por especialistas em ativos digitais e visa modernizar completamente o arcabouço regulatório para facilitar a adoção das criptomoedas no sistema financeiro tradicional.
Entre os principais pilares da iniciativa está a criação de diretrizes claras para classificar criptomoedas como valores mobiliários, commodities ou stablecoins, com protocolos objetivos que eliminem ambiguidades e reduzam a dependência do desatualizado Teste de Howey. A proposta também introduz um “sandbox regulatório”, permitindo a empresas inovadoras testar produtos como ICOs e airdrops sob supervisão parcial antes de avançarem para o regime completo de licenciamento.
Um ponto central é a integração de tokenized securities (títulos tradicionais em formato digital), habilitando negociações on-chain mais eficientes. Além disso, o plano apoia o surgimento de “super-apps”, plataformas onde corretoras podem oferecer staking, empréstimos e negociações cripto e tradicionais com uma única licença — uma abordagem que unifica serviços e reduz burocracias regulatórias.
O novo posicionamento da SEC representa uma ruptura significativa em relação à anterior postura de fiscalização intensa e repressiva da era Gary Gensler. A abordagem de Atkins prioriza a inovação enquanto ainda mantém a proteção dos investidores, com novas exigências de transparência e controle. O objetivo declarado é que os EUA não apenas recuperem empresas que migraram para outras jurisdições, mas também se consolidem como líder global em fintech, DeFi (finanças descentralizadas) e cripto.
Em paralelo, a SEC formou uma Força-Tarefa de Criptomoedas em janeiro de 2025, liderada por Mark Uyeda e Hester Peirce. Esse grupo promove discussões públicas, incluindo mesas redondas chamadas “Spring Sprint Towards Crypto Clarity”, para debater temas como classificação de ativos, registro, divulgação de informações e fiscalização moderada. O presidente interino da SEC, Uyeda, propôs também esquemas temporários de isenção regulatória, estimulando a inovação a curto prazo enquanto se desenvolvem regras permanentes.
Outra iniciativa importante é a criação da Unidade de Ciber e Tecnologias Emergentes (CETU), destinada a combater fraudes envolvendo blockchain, tokens e outros crimes cibernéticos. Liderada por Laura D’Allaird, a CETU reúne cerca de 30 especialistas com o objetivo de proteger investidores e ativamente coibir práticas ilícitas que prejudicam a confiança no setor.
Ao mesmo tempo, o governo federal instituiu o que passou a ser conhecido como reserva estratégica de bitcoin e ativos digitais, decisão institucionalizada por meio de ordens executivas do presidente Trump no início de março de 2025. A medida formaliza que os EUA manterão uma reserva nacional de criptomoedas (incluindo Bitcoin, Ethereum, Solana e Ripple), utilizando ativos confiscados e posicionando o país como detentor estratégico de um volume estimado de 200.000 BTC. Tratada por muitos como simbólica, a reserva reforça o compromisso político com a liderança no setor.
Os congressistas também encaminharam legislação relevante. A Câmara aprovou o Genius Act, estabelecendo nova regulamentação para stablecoins, e o Clarity Act, que define claramente quais ativos digitais são classificados como valores mobiliários. Essas novas leis fundamentam juridicamente grande parte da estratégia de inovação regulatória.
Em conjunto, todas essas ações sinalizam uma abordagem coordenada entre o Executivo, o Legislativo e o regulador para atrair empresas cripto, acelerar o crescimento do mercado e oferecer um ambiente regulatório estável e favorável.
Este conjunto de políticas representa uma estratégia integral e sem precedentes, que ouve demandas da indústria e institui marcos regulatórios que equilibram inovação e segurança. Se bem consolidada, o plano pode consolidar os Estados Unidos como referência global em tecnologia financeira, DeFi e infraestrutura digital, enquanto redefine o papel do Estado no impulso às criptomoedas.
O maior desafio será equilibrar inovação com proteção ao consumidor: o foco agora está em evitar abusos, garantir transparência, facilitar o investimento generalizado (inclusive em pré-venda de tokens), e manter os EUA na liderança global num momento estratégico para a próxima era das finanças digitais.